A banda britânica Wolf Alice, com a frontwoman Ellie Rowsell, cativou ouvidos atentos desde o primeiro álbum, My Love is Cool (2015), que foi um passo para algo mais elaborado, com indícios das sonoridades que explorariam nos álbuns futuros, mas nesse primeiro momento apresentados de forma tímida. Visions Of A Life (2017) transmitia a honestidade quase brutal das letras intensas, refletindo a confusão da casa dos 20 e tantos anos. A amplitude da abordagem vai do angelical ao agressivo rapidamente ao longo das faixas. Não somente isso, flutua entre punk rock e alternativo; os anos 90 de maneira original.
Blue Weekend marca uma nova era e um amadurecimento musical do grupo. A abertura do álbum dá-se com “The Beach”, com progressão do instrumental e dos vocais. Ao mesmo tempo que possui a voz grave, sobrepõe com outra de tom mais agudo; o sombrio com o angelical. A dualidade da construção culmina em um momento com várias vozes de diferentes tons, impulsionadas por um instrumental vigoroso, entregando para a próxima música a missão de acalmar a maré. “Delicious Things” começa com jeito de dreampop, mas logo a linha de baixo demonstra um lado sensual da letra ao descobrir ao poucos a liberdade de tomar conta de sua própria vida, a realidade de viver em um sonho, mas ainda obter a experiências das armadilhas dessa liberdade; o clima etéreo da melodia em sua maior parte reafirma a atmosfera de sonho realizado, destacado no refrão “A girl like mе, would you believe I’m in Los Angеles? / Uma garota como eu, você acreditaria que estou em Los Angеles?”.
Prosseguindo com a falsa sensação de calmaria, “Lipstick On The Grass” continua na mesma vertente da música anterior, mas apoiando-se ainda mais no etéreo. Os vocais celestiais são um contraponto para a letra ácida sobre relacionamentos fracassados e possíveis traições, quando nenhum dos dois está disposto a abrir mão da relação. Ácida e irônica, “Smile” vai e volta do grunge ao pop nos interlúdios e no refrão, entregando uma brincadeira entre os gêneros ao explorar a potência da flutuação sonora da banda. “Safe From Heartbreak (if you never fall in love)” a princípio é uma melodia beirando o acústico, atravessando a sonoridade do folk e com corais reforçando a letra que sustenta o mantra heartbreaker comum de “não se apaixonar para não se ferir”.
“How Can I Make It Ok?” utiliza certa progressão crescente no instrumental, adicionando os elementos aos poucos para dar textura á melodia. Alguns traços da canção remetem “Dreams” de Fleetwood Mac e ABBA, sensação reforçada com a ambiência do clipe em um karaokê. A letra carrega a dificuldade de deixar o outro ir, refrão com ecos celestiais, voz aguda que nos antecipa a virada no instrumental que virá. “Play The Greatest Hits” é um vulcão em erupção: explosão do punk rock, ritmo frenético com vocais eletrizantes, utilizando o recurso de palmas e a bateria bem trabalhada de Joel Amey, além das rimas bem trabalhadas para fixar na cabeça de quem escutar, uma anarquia musical deliciosa. “Feeling Myself” remete ao intimismo do shoegaze, quebra o clima da música anterior com sua calmaria sensual, uma sensibilidade moderna que se rompe em uma aura inebriante.
“The Last Man On Earth” demonstra a ambição de Wolf Alice em Blue Weekend. Uma música que, assim como “Life On Mars?” do Bowie, é conduzida de forma lenta até explodir como dinamite. A letra é sensível e tocante, com um coral que ajuda a incendiar e ostentar a relevância do álbum para o futuro do gênero. “No Hard Feeling” é mais limpa, com Ellie acompanhada basicamente pelo baixo, sem o reverb amplamente utilizado ao longo do disco. A faixa é mais limpa e menos teatral na melodia, deixando o teatro para as cenas descritas e o drama para a letra. “The Beach II” encerra com suavidade depois da tempestade, assim como o mar, ora turbulento, ora calmo. Uma letra que explora as imagens, mais contemplativa, encerrando todas as nuances de forma suave, com leves distorções de que tudo pode mudar a qualquer momento.
Wolf Alice ascendeu rapidamente na indústria. A obra singular que eles entregam neste trabalho chega ao público de forma sedutora, com muitas guitarras distorcidas, o bom uso de reverberação nos vocais; a dualidade do instrumental suave e potente/energético e celestial torna o disco um devaneio alternativo muito coeso. A discrepância em letra e melodia favorece a adaptação em diferentes momentos, flutuando de um gênero ao outro naturalmente.
O terceiro e desafiador álbum do grupo consolida a importância da banda na cena alternativa britânica. Além disso, apresentam a vulnerabilidade e inovação que o gênero precisa, renovando-se em nomes menores para continuar vivo em seu propósito. O som excêntrico apresenta também uma tendência das bandas lideradas por mulheres: o sopro de originalidade ao criar diferentes atmosferas utilizando a maior parte dos recursos e gêneros disponíveis, captando o melhor dos vários mundos, entregando algo singular para os ouvintes.
9/10
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