As imagens futurísticas de códigos flutuantes e um corpo encolhido dentro de uma bolha no espaço que se intercalam com cenários vibrantes dignos das maiores produções pop são apenas o começo da jornada através do universo da francesa Kiara Jones. O trabalho da cantora se encontra na mistura do pop com jazz, do neo-soul com referências do R&B da virada do milênio, uma sonoridade cósmica minimalista e ao mesmo tempo expansiva.
Ela cresceu nos anos 1990 em um ambiente criativo, rodeada por artistas, músicos, pintores, cineastas e estilistas, além de referências como Aaliyah, TLC, Destiny’s Child, Pharrell, Lauryn Hill, Erykah Badu e Outkast. Uma “introvertida por natureza”, como se descreve, ela não demorou muito para encontrar na cantoria uma forma de se expressar e se comunicar. “[A voz] foi o primeiro ‘instrumento’ que tive”, conta.
As harmonias vocais são peças centrais em suas composições, como pode ser visto desde seu primeiro single, “Black Garden”, de setembro de 2019, uma canção suave e mais acústica. O EP homônimo veio no final de 2020, com singles mais percussivos e que puxavam mais para o jazz alternativo, como “Sober” e “And I Feel The Same”.
Em Tada, seu mais novo EP, a cantora se aprofunda no electro-pop com pitadas de jazz, marcando um retorno às raízes neo-soul. O resultado é uma interpretação do R&B alternativo com batidas envolventes potencializadas por visuais arrebatadores, expostos nos singles “All The Lights” e “Tada”.
Em entrevista exclusiva ao ROCKNBOLD via e-mail diretamente de Paris, Kiara Jones falou um pouco mais sobre sua jornada na música, inspirações, desafios e o processo criativo de seu novo trabalho:
Quando você percebeu que queria entrar na música de forma profissional? Eu vi que você já trabalhou em recursos humanos e tem um mestrado em Economia e Administração Social – imagino que deva ter sido uma mudança e tanto!
Sabendo da realidade dura do mundo musical, meus pais me incentivaram a [focar nos] estudos por bastante tempo. Depois de conseguir meu diploma de mestrado e voltar à vida profissional, apesar de todos os meus esforços, eu não me sentia realizada. Não me arrependo. Como uma artista independente, isso me ajuda diariamente! Mas foi assustador fazer essa escolha, eu tive que trabalhar durante o dia e fazer shows à noite. Quando eu não tive mais dias de folga o suficiente, tive que escolher, e escolhi a música.
Quando você toma esse tipo de decisão, você tem que pensar duas vezes. Porque é um emprego a longo prazo. Precisa de muita motivação, trabalho, perseverança e estar 100% convencido do seu projeto. Nunca desista, nunca. Esteja preparado para receber críticas, se questionar, sem duvidar de tudo. Cultive sua identidade própria, sempre siga em frente.
Você teve uma breve passagem pela versão francesa do programa The Voice com uma performance forte de “I Feel Good”, do James Brown. Como foi essa experiência para você, ver um pouco desse outro lado da indústria musical? Você já mencionou seu desconforto em como gravadoras grandes muitas vezes tentam confinar artistas não-brancos dentro de uma caixa – como você vem quebrando isso?
Ser [uma artista] independente me permite ter uma liberdade criativa total por ser a “chefe” da minha linha editorial sem precisar me preocupar se o resultado é agradável ou não. Posso ser autêntica sem precisar me conformar ou corresponder a clichês e estereótipos. Hoje estamos sob uma obrigação de produção e resultados em uma sociedade consumidora, esse é o grande problema do consumismo. Quando eu crio, tento ir no meu próprio ritmo para criar meu próprio espaço.
Em setembro de 2019, por exemplo, decidi lançar meu primeiro single, “Black Garden”, composto no meu quarto no violão e tomei a decisão durante a gravação no estúdio de deixá-lo praticamente do jeito que estava. Queria uma canção que me representasse completamente.
Falando sobre o seu novo EP, Tada, notei um certo contraste entre ele e seu EP anterior Black Garden, de 2020. Enquanto o de 2020 parecia mais tranquilo e minimalista, com faixas mais acústicas, Tada tem sons mais pop, eletrônicos, com batidas mais vibrantes que lembram o funk e o disco dos anos 1980… O que te levou a escolher esses elementos e seguir essa direção para esse lançamento?
Desde o lançamento do meu primeiro EP Black Garden, tive a oportunidade de produzir “Never” e “All The Lights”, que me prepararam para o lançamento do meu segundo EP Tada. Foi muito espontâneo! Fiz muitas músicas com o objetivo de lançar meu primeiro álbum, as músicas eram muito diferentes, tivemos que tentar agrupar aquelas que eram as mais solares e coerentes porque queríamos oferecer algo alegre depois dos acontecimentos difíceis desses últimos anos.
Você colaborou com outros artistas nas faixas deste novo EP?
Para Tada, eu tive a oportunidade de trabalhar com artistas, engenheiros e músicos talentosos com quem tenho afinidade. Este segundo EP é um retorno às raízes neo-soul, eu exploro outros estilos, como jazz contemporâneo, R&B alternativo com Lévis Reinhardt, pop internacional, um toque francês emblemático dos anos 2000 no estilo Daft Punk com Jul Erades e pop electro-urbano com Jeremy Louwerse.
Eles são todos excelentes baixistas e nossas criatividades funcionam muito bem juntas! É muito importante ter um grupo bom que estimula, com quem é divertido trabalhar, que te impulsiona a ir mais longe. O mais importante para mim é trabalhar com pessoas com quem tenho uma química artística.
Como é o seu processo de escrita? De onde vem sua inspiração, especialmente neste EP?
Legal receber essa pergunta porque este é o tema principal da faixa “Tada”, que fala sobre a “síndroma da página branca”, que seria para mim o medo de decepcionarmos a nós mesmos ou aos outros. O que digo nesta canção é que nós podemos todos criar, mas ficarmos satisfeitos, é um sentimento incrível. Eu queria colocar isso em música porque a inspiração não pode ser controlada. Não poderia dizer precisamente de onde vem a inspiração, das coisas que vivo, das pessoas que encontro, mas quando aparece é maravilhoso!
Outra parte importante do seu trabalho são os visuais de tirar o fôlego – os vídeos para “Never” e “All The Lights” trazem elementos sci-fi e afrofuturistas, enquanto “Tada” tem muitas referências dos anos 2000… O que te inspirou a construir essas narrativas visuais e como foi o processo de criá-las?
Um pouco de tudo. Um filme que vi no dia anterior, uma exibição que eu amei, um lugar incomum. Eu gosto muito de moda, dança e arte. O lado visual do meu projeto é muito importante para mim, ela me permite oferecer uma experiência sonora imersiva, ir mais longe no que quero expressar. Assim como artistas como Tyler The Creator, FKA Twigs, Childish Gambino ou Kendrick Lamar.
Estou sempre presente na pré e pós-produção dos meus clipes. Em “Black Garden”, “Sober”, “And I Feel The Same”, “Never” e “All The Lights”, tive a chance de trabalhar com grandes designers gráficos, diretores e produtores. Tendo uma ideia muito precisa do que eu queria, comecei a dirigir e decidi co-dirigir meu último videoclipe, “Tada”!
Quais são seus planos para 2022?
Estou trabalhando em canções novas e preparando novos clipes. Espero poder fazer shows e estar presente nos palcos de festivais no verão de 2022. E por que não novas parcerias? Também tivemos propostas para shows fora [da França]. Então mal posso esperar para ver o que 2022 nos reserva!
Podemos esperar um show no Brasil num futuro próximo?
Eu ficaria muito feliz em ir ao Brasil, é um país que eu particularmente gosto muito e adoraria visitar e fazer alguns shows! Com a crise de saúde foi difícil planejar, mas agora que as coisas estão melhorando cada vez mais… Bora!
Kiara Jones Entrevista Kiara Jones Entrevista Kiara Jones Entrevista