MCID: O álbum mais recente e confuso do Highly Suspect

Dizem que um raio não cai duas vezes no mesmo lugar, e no caso do Highly Suspect, esse ditado popular se mostra verdadeiro. A banda, que mistura garage rock, rap, synth, entre outros elementos em suas composições, teve um debut estrondosamente promissor. Logo de cara, seu primeiro álbum, ‘Mister Asylum’ de 2015, foi indicado ao Grammy Awards, assim com um de seus principais hits, “Lydia”, que concorreu a Melhor Música de Rock naquele mesmo ano. Com a produção de Joel Hammilton, Mister Asylum também trouxe outras faixas de destaque, como “Lost”, “Bath Salts” e “23”, que exploravam muito bem diversos elementos dentro do rock. Apesar de pouco complexo, a variação de riffs e solos com características do grunge, alt e até mesmo blues se mostrava extremamente criativa e original.

Mister Asylum é energético, agressivo, rebelde, e talvez por isso teve ótimas avaliações da crítica especializada, que salientavam como o som puro, sem muitos efeitos artificiais, soava como um novo respiro para o garage rock tradicional. Muitos inclusive apostavam que o Highly Suspect seria o próximo grande nome entre revelações rock, ao lado de Royal Blood.

No ano seguinte, a banda não quis perder tempo – nem hype – e lançou seu segundo álbum de estúdio, ‘The Boy Who Died Wolf’, que trouxe os destaques “My Name Is Human”, “Serotonia” e “Viper Strike”, porém nada tão especial que a gente já não tivesse escutado. Ou melhor, segundo álbum era bastante diferente do primeiro, sim. Sua sonoridade, apesar de ainda voltada para o rock, rap, garage e grunge, é bem mais experimental e sensível.

A faixa falada “Viper Strike” traz fortes críticas a homofobia, racismo e fanatismo religioso. “Send Me An Angel” também trouxe um tom mais melódico e sensível para o que até então parecia ser uma banda carrancuda. Nas letras mais reflexivas, a voz rouca e rasgada de Johnny Stevens fala sobre sofrimento e isolamento de forma honesta para um bad boy. É interessante enxergar este lado mais humano e sentimental do frontman, que até então parecia um rockstar inabalável. Entretanto, comparado ao primeiro álbum, ‘The Boy Who Died Wolf’ é muito menos contagiante e carismático.

MCID

O termo MCID, ou “My Crowd Is Dope”, já era bastante conhecido pela banda e seus fãs, além de bastante presente nas redes sociais de seus integrantes, tal qual um lema. A toa ou não, após três anos sem novidades, a sigla veio a se tornar o nome do terceiro álbum da banda, lançado em 2019.

A expectativa em cima do álbum era grande. Em suas redes sociais, Johnny Stevens comentava sobre o quanto estava orgulhoso do que estava produzindo, chegando até a se emocionar entre milhares de stories no Instagram. Os primeiros singles divulgados, ‘16’ e ‘Upperdrugs’ tiveram excelente recepção do público. De pouco em pouco, o vocalista também começou a divulgar informações sobre colaborações que este álbum traria – algo que até então era inédito na banda –, incluindo as bandas Nothing But Thieves, Gorija e o rapper Young Thug. O hype para o que poderia ser o melhor e mais ambicioso álbum do ano não poderia ser maior.

O terceiro álbum de estúdio do Highly Suspect, MCDI, foi lançado em novembro de 2019 e, para a maioria dos fãs e críticos, não atendeu as expectativas. Em alguns casos de opiniões mais extremas – como a minha –, tinha tudo, convidados, elementos e produção para ser um ótimo disco, mas foi decepcionante.

MCID é, sem dúvidas, o álbum mais ambicioso da carreira do Highly Suspect, especialmente para Johnny Stevens, que parece ter decidido abrir o seu coração de vez – talvez até demais. Ao contrário dos dois primeiros discos, a influência do rap e synth se sobressaem ao rock, e se tornam predominantes, como se a banda tivesse decidido a não se limitar a uma banda de rock. Suas canções falam sobre abuso de drogas, traição, desilusões, auto-degradação, sonhos, entre outros temas pertinentes de forma extremamente pessoal. A impressão é que Johnny decidiu colocar em um único álbum tudo o que gostava, tudo o que guardava e tudo o que viesse a mente, resultando em um álbum demasiadamente variado, inconsistente, que não segue uma linha ou algum conceito que faça sentido. Nada foi planejado, apenas gravado e jogado para estar ali.

O Highly Suspect conseguiu criar um álbum que une gospel, rap, synth, rock, metal, country (!!?), blues, trap, além de três faixas completamente instrumentais. Tudo isso de forma extremamente confusa e desconexa, com transições bruscas de uma faixa de rap para metal, e então country. Logo na primeira faixa, “Fly”, somos conduzidos por um verdadeiro musical sobre a vida e superação de Stevens, onde o frontman fala sobre baixa autoestima, depressão, traumas de abandono, e termina agradecendo os fãs e mandando um salve para todos. Já a “16” traz uma história extremamente intima, e talvez um pouco íntima demais, sobre traição. “Freakstreet” é interessante ao misturar rimas de rap e synth, assim como “Canals”.

Eu queria não ter que dizer que a faixa em colaboração com o Nothing But Thieves não é ruim, mas na realidade ela é terrível. Nela temos a certeza que Johnny é realmente uma pessoa solitária, e não teve nenhum amigo ao lado para dizer que aquela música era uma péssima ideia. As vozes de Stevens e Conor Mason tinham o potencial de fazer algo extremamente grandioso, infinitamente maior do que uma música tosca cujo refrão diz que queriam ser o ursinho de alguém. Até mesmo “SOS”, outra faixa completamente desconexa que traz elementos de metal com a colaboração do Gorija, é melhor infinitamente melhor.

“Arizona”, apesar de também extremamente desconexa com o restante do álbum, é uma agradável surpresa. A faixa escrita e interpretada pelo baixista Richard Meyer é composta apenas de voz e violão, com um agradável arranjo instrumental de violinos e violoncelo, e grande influência country. Exatamente o tipo de música que você esperaria ouvir do Mumford and Sons. Até mesmo “These Days”, sonoramente semelhante ao Foo Fighters, peca nas letras esdruxulas que tornam o álbum ainda mais intragável:

Sometimes I need to bust a nut. That doesn’t mean I don’t love you. So what? You saying that you wish that I was playing with your butt

These days – highly suspect

Ao fim do álbum, espera-se que o ouvinte fique no mínimo cansado e confuso com o que acabou de ouvir, e ainda mais confuso ao tentar definir sobre que estilo se trata o Highly Suspect. A banda peca ao tentar atingir a sonoridade de gigantes como Red Hot Chilli Peppers, Foo Fighters, Queens of The Stone Age e até mesmo Rage Against The Machine, mas consegue no máximo reproduzir uma mistura bizarra de Twenty-One Pilots e Imagine Dragons.

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