Existe um “ditado popular” entre os fãs de música: quando certa banda faz trilha sonora para algum filme, ela se torna a banda daquele filme. Isso aconteceu com Joan Jett e “Bad Reputation”, que foi usado no primeiro filme da franquia “Shrek”; com o Muse e “Supermassive Black Hole” e “Crepúsculo”… E com Green Day, para a mesma saga.
A banda, que até então era declarada como o último suspiro do punk rock como conhecemos (uma versão do The Offspring muito mais carismática e com mais frescor), já não vinha agradando os fãs desde o álbum sucessor do grandioso “American Idiot”, “21st Century Breakdown”. Muito mais recatado e até mesmo tímido, Green Day se rendeu a produções mais elaboradas e menos cruas com a trilogia “Uno!”, “Dos!” e “Tres!”, que ainda carregava a adolescência tardia de uma banda que foi febre nos anos noventa.
Já fazia um tempo que os americanos emplacavam hits, como aconteceu entre 2004 e 2005. Extremamente politizados e rebeldios, ainda existia, naquela época, fôlego para bancar brigas contra o governo que financiava guerras no Oriente Médio e a manipulação dos veículos de comunicação. Não é um cenário muito diferente de 2019 e 2020, mas esvaiu-se um pouco – afinal de contas, ninguém vive os “vinte e poucos” anos para sempre.
Agora pais de família e quarentões, Green Day faz um refresh na discografia com “Father of All…”, que, honestamente, relembra os bons tempos onde “Dookie” marcava presença forte nas rádios e nos canais de TV musicais. Relembra tempos mais fáceis, com amplificadores altos e crus, como o bom punk rock da época.
“Father of All…” nada contra a maré de artistas que se entragaram à pegada oitentista, aos sintetizadores e influências do techno, que hoje em dia estão extremamente massificadas entre bandas de rock e flerta com o pop.
No entanto, é válido ressaltar que Green Day usa com bastante inteligência influências dos anos 80, mas de forma diferente: “Oh Yeah!”, por exemplo, utiliza samples de “Do You Wanna Touch (Oh Yeah)”, de Joan Jett, a rainha do rock da época, que deu um grito pelas mulheres da geração. Uma bateria com tempo marcante, e riffs que são reconhecidos de longe por qualquer fã da época, transformam a faixa em um dos highlights do álbum.
“Fire, Ready, Aim”, o single de estreia, foi feito na medida certa para deixar as expectativas do álbum como ele realmente é: vibrante, animado e rápido. E, é claro, é possível perceber que não foi a melancolia de Billie Joe Armstrong que tomou conta do processo criativo. Não mais.
“Take The Money and Crawl”, que usa e abusa de vozes cinemáticas, é a faixa que mais lembra as bandas indie que estão fazendo sucesso entre os fãs no momento. É exatamente como se o Green Day quisesse se mostrar como uma banda, de fato, debutando. De alguma forma, isso aproxima a banda de um público mais novo, que está descobrindo música nova.
“Graffitia”, a última faixa do disco, finaliza com uma despedida bastente gostosa, sem gostinho de quero mais, com a plena consciência que terminou no momento certo. “Father of All…” é um álbum que pode cativar os fãs mais antigos, mas que, claramente, está tentando renovar a banda e deixar um pouco para trás a mesmice, a zona de conforto do pop rock que foi criada a partir de 2011.
Ao mesmo tempo, recupera um DNA que havia sido deixado na geladeira por uns bons dez anos. É um álbum bastante acertado, não enjoativo, que, com dez faixaz e menos de meia hora de duração, traz um espírito jovem que somente o Green Day é capaz de fazer sentir.