O pop divertido e poderoso de Rina Sawayama

Foto: Divulgação.
Conheça um pouco da história da cantora nipo-britânica que vem remodelando o pop de forma única

Existem cantoras pop. E existe a Rina Sawayama. Claro, foi nesse gênero que a artista brilhou para o mundo, especialmente depois do lançamento de seu aclamado álbum de estreia, SAWAYAMA, em 2020. Mas o escopo de Rina vai muito além.

Nascida em Niigata, no Japão, em 16 de agosto de 1990, a cantora se mudou aos cinco anos de idade para Londres, onde cresceu e reside até hoje. Essa experiência (e até mesmo um certo conflito interno) de crescer com referências culturais dos dois lugares ao mesmo tempo em que sofria racismo e xenofobia justamente no país onde passou a maior parte da vida é traduzida de forma impactante em seu trabalho. Somam-se a isso as referências musicais e visuais de peso e a desenvoltura divertida de Rina e temos uma artista única de altíssimo nível.

Formada em ciência política pela Universidade de Cambridge, Rina também carrega no currículo trabalhos como modelo e em breve estreará no cinema em John Wick 4. Vem conhecer um pouco mais dessa artista que tem tudo para conquistar o mundo:

Inspirações

Depois de “trabalhar em dois ou três empregos ao mesmo tempo por anos” para conseguir juntar dinheiro, a própria artista lançou seu primeiro EP, Rina, de forma independente em 2017. O trabalho era mais voltado para o R&B, mas já misturava referências que iam de Mariah Carey na faixa “Cyber Stockholm Syndrome” ao pop chiclete de Britney Spears e NSYNC, passando por synthwave e até J-Pop. 

Mesmo em SAWAYAMA, inspirado com muito mais força no pop dos anos 2000, com referências claras ao trabalho de Britney e de Christina Aguilera, Rina trouxe também a potência do nu-metal de bandas como Korn e Evanescence, e de artistas como Limp Bizkit, Avril Lavigne e No Doubt. O resultado é uma composição sólida e deliciosamente nova.  

Orgulho queer

Em 2018, Rina se assumiu publicamente como pansexual, mais explicitamente pela primeira vez na canção “Cherry”, inspirada por uma troca de olhares no metrô de Londres e por uma “bifobia internalizada e vergonha”, como a artista descreveu para a Billboard na época. Desde então, ela fala cada vez mais abertamente sobre sua sexualidade em seu trabalho e com seus fãs, os Pixels. 

À época, ela também falou sobre como não conversava com seus pais sobre sua orientação sexual. “Sexo não é algo a ser discutido em lares asiáticos – e ponto final. Então não estou surpresa que [meus pais] não comentaram sobre [a música]”, disse. “Eu tenho outra família, então tudo bem: minha família de amigos, minha família adotada!”

Ainda na faculdade, a cantora se sentia menosprezada e isolada por colegas britânicos que a tratavam como intercambista estrangeira apesar de ela ter passado a vida toda no Reino Unido. No último ano do curso, ela finalmente se sentiu abraçada por um grupo de artistas queer, que incluía a banda de drag queens DENIM. Segundo Rina, foram esses amigos que salvaram sua vida quando passava por um momento mais delicado da depressão (saúde mental é outro tópico recorrente nas conversas da artista).

Essa “família escolhida” foi homenageada na canção “Chosen Family” de SAWAYAMA, que em 2021 ganhou uma nova versão com participação de ninguém menos que Elton John. A letra alude justamente à não-aceitação que grande parte da comunidade LGBTQIA+ experimenta de sua família de sangue – e a importância de encontrar acolhimento em seu grupo de amigos. 

Soltando a voz dentro e fora do estúdio

Desde antes de aparecer um pouco mais no mainstream, Rina já era conhecida por seu ativismo LGBTQIA+ e antirracista. Em 2020, ela assinou ao lado de Elton John e Charli XCX uma carta aberta demandando ao governo britânico a proibição da chamada “terapia de conversão” em jovens LGBTQ+.

Além de exaltar e falar sobre sua sexualidade, Rina também usa a música para falar sobre sua experiência como imigrante asiática no Reino Unido. Em entrevista à Billboard em 2021, a artista contou que uma vez descobriu que um executivo de gravadora a chamava de “Rina Wagamama” por trás dela, em referência a uma rede de restaurantes inspirada na culinária japonesa. 

Rina faz referência a essa e outras experiências desagradáveis no vídeo de “STFU!”, em que um homem branco fala uma série de micro agressões baseadas em frases que a própria cantora ouviu ao longo dos anos, como a surpresa com o fato de ela performar em inglês ou que ela é uma “versão mais sexy” das atrizes Sandra Oh e Lucy Liu ou, ainda, que ela “nem parece” japonesa. A Billboard descreveu a faixa como “uma reencarnação do Limp Bizkit se Fred Durst fosse a JoJo.”

Já na divertida faixa “XS”, Rina tira sarro do capitalismo que incentiva as pessoas a continuarem consumindo mesmo em meio a todo o caos do mundo. “Considerando que sabemos que a mudança climática global está acelerando e a extinção humana é uma possibilidade bem real dentro da nossa expectativa de vida”, a cantora escreveu em um texto de lançamento, “me pareceu hilário que marcas ainda estavam lançando novas paletas de maquiagem todo mês e figuras públicas estavam fazendo tour da casa gigante delas em Calabasas na mesma semana que faziam um post no Instagram sobre ‘estar triste com as queimadas na Austrália.’”

Luta pelo reconhecimento

Ao longo de 2020, Rina também expressou publicamente sua frustração com os critérios de elegibilidade de prêmios da música, especialmente do Brit Awards e do Mercury Prize, alguns dos mais importantes no Reino Unido. Até então, apenas artistas com cidadania britânica podiam concorrer e, como o Japão não permite cidadania dupla, Rina não tem um passaporte britânico – o que fez com que SAWAYAMA fosse inelegível ao Mercury daquele ano.

“Foi simplesmente devastador”, ela disse à BBC News. “Acho que muitos imigrantes se sentem dessa forma – onde eles assimilam e se tornam parte da cultura britânica… E ouvir que nós não somos nem elegíveis a indicações [nos faz sentir] como ‘o outro’”.  

Rina também expressou sua tristeza com a situação à Vice. “Tudo que eu lembro é de viver aqui”, disse. “Eu só morei aqui a minha vida toda. Eu fui para escola de verão no Japão, e é literalmente só isso. Mas eu sinto que contribuí ao Reino Unido de uma forma que acho que é digna de ser celebrada, ou ao menos ser elegível a ser celebrada.” 

E falar sobre o assunto deu certo: Rina depois se reuniu com o grupo organizador dos dois prêmios e conseguiu que mudassem os critérios para indicação. Assim, a artista foi indicada na categoria de Estrela em Ascensão no Brit Awards de 2021 e abriu portas a vários outros artistas não-britânicos que cresceram e se identificam com o país. 

Rina é uma artista que gosta de fazer barulho, mas sem perder a classe e a diversão. É nítido que a cantora consegue atravessar mensagens importantes de forma espetacular – e a gente ainda deve ouvir falar muito nela daqui para frente.

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