Querencia é uma palavra do espanhol para referir ao lugar onde se sente em casa e em que se é sua versão mais autêntica. Título do primeiro full album solo de CHUNG HA, é apenas uma pista das inúmeras influências da cultura hispânica. O tão esperado álbum conta com faixas inspiradas no som latino, como as já previamente lançadas Stay Tonight e Play, além das inéditas Masquerade e Demente, esta última cantada em espanhol.
Originalmente marcado para sair no dia 04 de janeiro de 2021, Querencia teve seu lançamento adiado após a cantora contrair o vírus da COVID-19 no final do ano anterior. A espera pelo disco e a torcida pela melhora da solista, afinal, compensou. Lançado dia 15 de fevereiro e contando com 21 faixas – destas, onze canções inéditas – divididas em quatro sides, Querencia prova CHUNG HA como uma das cantoras de k-pop mais requisitadas da atualidade e, também, uma das que prometem revolucionar o gênero.
Com interlúdios de um minuto marcando os diferentes lados (NOBLE, SAVAGE, UNKNOWN e PLEASURES), o álbum traz uma experiência marcada por diferentes conceitos, gêneros musicais e idiomas em uma hora. NOBLE traz sons obscuros e metalizados sobrepostos pela voz da própria cantora que apresenta o significado de seu álbum. “My own oasis, querencia”, ouvimos ao final, quando a batida some.
Este primeiro lado do álbum – e da cantora – conta com algumas de suas músicas mais fortes. Bicycle, o single de hip-hop lançado junto do álbum, esbanja autoconfiança e sexualidade, enquanto que Masquerade conta uma história de encontro amoroso secreto ao som do swing da salsa. Em uma das melhores músicas do álbum, Flying on Faith, as notas que começam mais simples e repetidas, acrescem com o som EDM-pop durante o refrão até regredirem a toques de piano, dando protagonismo e um complemento perfeito à voz de CHUNG HA. A última de NOBLE, Luce Sicut Stallae é delicada e promete deixar o ouvinte sorrindo, mas é também a mais fraca do primeiro lado do álbum.
SAVAGE traz o lado mais risky da cantora com as já conhecidas Stay Tonight e Dream of You (colaboração com o DJ marroquino-holandês R3HAB). Bother Me é cantada completamente em coreano e traz o vocal melodioso da cantora com um instrumental reminiscente aos anos 1990. No entanto, é Chill que chama atenção neste side. Com um som mais “pop ocidental” conduzido pelo baixo e por coral, a música é basicamente uma música chiclete de trilha sonora de filme (da melhor maneira possível) e promete deixar o ouvinte em sensação de deslumbre.
O terceiro lado do álbum é recheado de feats e experiências novas – como a colaboração com um artista porto-riquenho e a lembrança da jornada de CHUNG HA como cantora -, e talvez por isso se chame UNKNOWN. Um dos singles de promoção do álbum e colaboração da solista com o rapper Changmo, Play é uma fusão extremamente visual do reggaeton com o k-pop, que continua em Demente. Esta última marca a primeira colaboração de um artista latino com uma cantora solo de k-pop e tem tons chorosos que recordam a sofrência, mas as lembranças ao estilo brasileiro param aí. A canção traz os vocais de CHUNG HA para o espanhol, em uma contribuição com Guaynaa.
Lemon, colaboração com o cantor coreano Colde, tem uma vibe mais leve do que as anteriores deste lado e, apesar das batidas curtas trazerem sabor à música, acaba passando batido. Com toques acústicos de violão, CHUNG HA introduz a faixa BYULHARANG (160504 + 170607). O nome da música vem de seu fandom e as datas se referem a seus debuts com o girl-group I.O.I e, um ano depois, como artista solo. A canção foi co-escrita pela cantora e é uma das mais honestas e sentimentais de todo o álbum, facilmente se tornando uma favorita para os fãs e tocando até o ouvinte casual.
PLEASURES finaliza o álbum com o lado mais vulnerável da cantora. X foi o último single lançado antes do álbum e traz a cantora recordando um término ruim em uma faixa de pop-rock empoderada. A bridge de X é uma agradável mudança à habitual repetição de elementos do refrão que vemos em outras músicas da artista e prova que, com uma bridge encorpada, consegue-se trazer mais materialidade aos sentimentos do personagem. A frase repetida ao longo da música, “You should’ve loved me at my worst/ Now you just watch me on your TV screen” é icônica e, por si só, dá à música um posto entre as melhores do álbum.
All Night Long, apesar de mais carregada, lembra a leveza de Lemon e, como ela, é uma das mais fracas do álbum. Os vocais da cantora são destacados aqui, mas não é suficiente para deixar uma impressão. A balada Everybody Has tem contribuição do cachorro da cantora, Bambi, e narra a exaustão da jornada pelos seus sonhos, algo com o qual muitos poderão se identificar. Comes N Goes é uma canção esperançosa que poderia embalar a história de um k-drama. A finalização da música é espetacular com a sobreposição dos vocais e seria um final perfeito para o álbum. O disco termina, no entanto, com Querencia (Epilogue), uma faixa lo-fi com cerca de trinta segundos de puro silêncio no meio.
Querencia traz alguns dos aspectos mais positivos do k-pop enquanto se arrisca em elementos e continentes exteriores. O número de faixas é exorbitante para o gênero e o conceito de dividi-las em sides, apesar de interessante e conveniente, poderia ter um potencial maior caso fosse mais consoante às músicas do disco. Ainda assim e mesmo com as altas expectativas diante dos singles anteriores, o disco consegue ir além das expectativas e traz um trabalho de excelência. Durante a conferência de imprensa para o lançamento do álbum, a cantora admitiu como Querencia foi o espaço onde poderia ser autêntica e sentir-se em casa diante das dificuldades do último ano – daí o nome do álbum. Com Querencia, CHUNG HA apresenta o mundo como sua própria casa e sua música como porta de entrada.