K-pop ao redor do mundo: o sucesso do KPOP IN PUBLIC #2

A onda coreana, Hallyu, atingiu marcas até então aparentemente inalcançáveis no ano de 2020. No cenário cinematográfico, a gigante Netflix têm investido cada vez mais nos kdramas, fechando acordos com as duas maiores produtoras de dramas da Coreia do Sul, Studio Dragon e Jcontentree; e o sucesso internacional de “Parasita” foi tanto que o longa-metragem se consagrou Melhor Filme no Oscar – o primeiro filme não falado em língua inglesa a conseguir tal feito. No k-pop, o BTS quebrou todos os recordes possíveis nos charts americanos e conseguiu com “Dynamite” a primeira indicação do grupo ao Grammy. Entretanto, esta onda não se prende apenas ao consumo de artistas coreanos. Com o k-pop, o Hallyu movimenta fãs ao redor do globo, conecta pessoas de diferentes comunidades e as permite conhecer uma nova cultura.

Dentro das várias formas que os fãs de pop coreano encontram para se unir e apreciar a obra de seus artistas favoritos, uma virou uma febre em todo o mundo: o KPOP IN PUBLIC, um desafio em que vários grupos de dança vão para espaços públicos e apresentam as coreografias de uma determinada música de k-pop.

Esse é o segundo texto do especial sobre o KPOP IN PUBLIC ao redor do mundo. Ainda não leu o primeiro? Clique aqui e leia

Por Bruna Antenore, Isabella Vieira, Júlia Baruki e Lívia Stamato

HUSH CREW – Boston, Estados Unidos

K-Pop in Public Hush

Um “show repentino em que o público tropeça enquanto realiza tarefas do dia a dia”. É assim que Aaliyah, fundadora do Hush Crew, nos descreve o KPOP IN PUBLIC. O grupo de dança surgiu em 2019 com o objetivo de Aaliyah e seus amigos participarem de concursos na KCON e hoje já contabiliza mais de 40 membros e quase 40 mil inscritos no YouTube. A integrante conta que o grupo sediado em Boston é diverso quanto à experiência no k-pop. “Nosso grupo varia de pessoas que cresceram ouvindo k-pop a vida toda a pessoas que entraram no Hush Crew pra dançar com amigos e que acabaram ouvindo mais k-pop por conta disso”, comenta.

A onda coreana chegou em peso nos Estados Unidos, segundo o grupo. Se antes a venda de álbuns se limitava a cidades grandes como Los Angeles, hoje o merch é encontrado a valores muito mais acessíveis pelo país e “praticamente qualquer cidade tem comunidades de k-pop nas redes sociais”. Ainda assim, a maior parte do público que “tropeça” pelo show do Hush Crew não sabe muito de k-pop ou de dança cover. A integrante ainda conta que nunca observou olhares estranhos e que, aqueles que perguntam sobre o que estão fazendo, parecem estar sempre dispostos a checar o canal.

No YouTube, o grupo diversifica entre danças em estúdio, de sucessos de artistas como CHUNG HA e SEVENTEEN, a danças em público de grupos como o TWICE e o DREAMCATCHER. Apesar da tendência forte do KPOP IN PUBLIC, os membros afirmam que preferem gravar vídeos que os tragam liberdade na escolha do espaço. Com a trend, o grupo “acaba escolhendo as locações de filmagem baseadas no público” ao invés de lugares que combinem mais com a estética da música. “Temos permissões muito limitadas para filmar em lugares como shoppings, então costumamos ficar no nosso lugar de sempre na Downtown Boston”, afirma a fundadora.

Ainda sobre as coreografias, Aaliyah considera que o maior desafio fora das condições da pandemia é manter-se o mais fiel possível à coreografia original. “Os idols têm coreógrafos que os ensinam a dançar passo a passo. Nossa equipe tem um vídeo de ensaio ou uma fancam que a gente assiste inúmeras vezes para tentar imitar os movimentos e as formações”, argumenta. A dançarina recomenda aos que desejam dançar assistir a aulas e workshops em instituições de dança locais. Além disso, a integrante afirma que ouvir a música permite criar uma familiaridade com o ritmo, “muito útil para aprender novas coreografias”.

O grupo, formado hoje por mais de quarenta pessoas, tenta trazer autonomia aos seus integrantes. “Qualquer um dos nossos membros pode submeter projetos e liderá-los, decidir quem participa e como querem que seja filmado”, conta. Apesar dos obstáculos encontrados pelo grupo nos últimos meses, a líder é prática. “Essa é uma realidade que nunca imaginamos, mas com a qual temos de lidar diariamente.”

Confira o cover de “LA DI DA” do EVERGLOW gravado pelo HUSH CREW

JJANG B – Rio de Janeiro, Brasil

K-Pop in Public JJANG B

Diretamente do estado do Rio de Janeiro, o JJANG B é um dos maiores grupos de K-Pop cover do Brasil e está em atividade desde agosto de 2017, participando de competições do gênero e até de programas de TV aberta neste período. Conversamos com Kananda, Sabrina, Suelem, Mariana, Millah e Vitoria, 6 das 10 integrantes do grupo, a respeito da trajetória da equipe e dos desafios de realizar o KPOP IN PUBLIC no Brasil.

As meninas contam que o primeiro contato com os idols aconteceu de forma diferente de integrante para integrante. Algumas conheceram por meio do sucesso de PSY, “Gangnam Style”, outras por meio de amigas em comum que acompanhavam o gênero, e teve até participante que descobriu os grupos por meio de um erro de digitação no YouTube! Independente da maneira como conheceram os artistas, Mariana, que é a líder e criadora do JJANG B, descreve que a ideia de criar a equipe surgiu da paixão pela dança.  “Com o tempo, fui cada vez mais conhecendo mais coreografias, mais músicas diferentes e isso me despertou uma curiosidade e uma vontade de treinar aquilo. Eu já dançava e com o K-POP eu entrei em outro ritmo, totalmente diferente do que eu estava acostumada e um dia eu pensei: por que não chamar mais algumas meninas para poder dançar essa música e apresentar?”, relata. 

No começo, o JJANG B contava com 4 meninas, número que cresceu até chegar nas 10 integrantes de hoje em dia. Millah, uma das primeiras dançarinas do grupo, descreve como foi chamada para entrar na equipe. “Eu encontrei com a Mariana na primeira competição do Rio que participei, a K-Pop Expo Dance. A gente não conversou no evento em si, mas nós conversamos depois, e ela falou ‘olha, gostei do jeito que você dança, gostei de você, fica ligada que talvez eu te chame pra algum projeto’”, conta.

O canal do grupo chama a atenção principalmente pelos vídeos de KPOP IN PUBLIC em pontos turísticos. “Geralmente, a gente procura por lugares turísticos que o pessoal vai gostar de ver no vídeo. As pessoas de outras cidades, de outros países gostam de ver esse lado do Rio”, conta Mariana. De acordo com Sabrina, outra integrante do JJANG B, a escolha da locação para os vídeos depende de dois fatores principais: segurança e a execução da coreografia. “Por exemplo, se a gente se arrasta no chão, que tipo de chão é o da locação? É um asfalto? A gente vai se ralar? Vamos estragar nossa roupa? Outra questão é a segurança, então a gente evita gravar à noite porque pode ser perigoso pra gente, somos um grupo de meninas. Também levamos em consideração se vai ter muita gente no local, se vai ter policiamento”, diz a participante.

A líder do grupo reforça a necessidade por conforto e segurança na hora de gravar os vídeos de KPOP IN PUBLIC. “O Rio de Janeiro é muito quente, então a gente preza por um lugar que tenha sombra, que a filmagem fique boa, que tenha iluminação boa. Segurança também é importante porque a gente não pode ficar em um lugar muito deserto com câmera, caixinha de som, celular porque o Rio é bastante perigoso, então a gente procura um lugar que tenha bastante pessoas e misturamos tudo isso com o visual”, descreve Mariana. 

O visual também é importante para a JJANG B na hora de gravar os vídeos. Millah conta sobre o processo de escolha de ambientes para a gravação de vídeos mais profissionais. “Quando a gente quer fazer um vídeo mais profissional, um vídeo mais fechado, procuramos um ambiente que seja esteticamente condizente com a coreografia e com o figurino e que seja parecido com o que aparece no clipe da música original”, narra a integrante.

Segundo Vitoria, as pessoas acompanham as gravações do KPOP IN PUBLIC de uma forma receptiva. “Eles aplaudem, elogiam, procuram saber quem é o grupo, conhecer nossas redes sociais, e tem até as vezes que outros kpoppers encontram a gente. É um ambiente bem legal. Não vejo a galera reconhecendo as músicas, mas vejo reconhecendo a área k-pop e as pessoas olham com admiração”, conta. Kananda, outra integrante do JJANG B, descreve que as reações do público são interessantes. “Mesmo quando não tem tanta pessoa assim, a gente consegue captar algumas reações. Geralmente as pessoas olham e ficam ‘hm… diferente, o que tá acontecendo?’. Dificilmente alguém reconhece o que a gente tá dançando porque muita gente ainda não é muito familiarizada com o k-pop, mesmo que hoje em dia esteja muito mais em alta, mas muita gente ainda não conhece”, relata a dançarina. 

Reforçando o ponto levantado por Kananda, Millah fala sobre a sensação dos espectadores ao assistirem as gravações do KPOP IN PUBLIC. “As pessoas gostam principalmente pelo fato de ser um grupo de dança, é como se fosse um show particular.  Por exemplo, no vídeo de “Very Nice”, do SEVENTEEN, que a gente fez uma produção bem grande, foi um dia bem movimentado em Copacabana e a galera passou e esperou a dança terminar pra tirar foto e agradecer pelo ‘show’, além de nos marcarem nas redes sociais, coisa que realmente ajudam a gente a estar crescendo de pouquinho em pouquinho”, conta. 

Como o grupo é brasileiro, a zoeira também não podia ficar de fora. Segundo Mariana, apesar da admiração pela dança, o público também brinca na hora das gravações. “O melhor do Brasil são os brasileiros e o brasileiro é muito da zoeira, muito brincalhão. Às vezes também acontece do pessoal aparecer nos vídeos só para zoar, para aparecer no fundo do vídeo e fazer um tchauzinho”, descreve a líder. 

Sobre a dificuldade das coreografias, Sabrina ressalta que algumas danças de k-pop exigem habilidades especiais. “Às vezes a coreografia quer que a gente dê um backflip, e a gente não sabe fazer um backflip, então aprendemos a fazer o backflip”, conta. A integrante Suelem chama a atenção para os desafios de montar as coreografias em grupo. “Pensamos no grau de dificuldade que cada sequência apresenta, a agilidade de cada execução e as trocas de formação. Nós aprendemos as coreografias individualmente e nos reunimos em grupo apenas para fazer a limpeza. Cada uma recebe o nome da pessoa do grupo que vai representar, qual vai ser o seu papel no grupo. Acho que não tem nenhuma fórmula mágica, não tem nenhuma receita de bolo de como a gente faz. Vamos opinando de acordo com o que cada integrante entende no vídeo”, relata.

Por conta da pandemia, as meninas pararam com os ensaios semanais e tiveram de repensar os conteúdos para o canal no YouTube. “Acho que o maior desafio foi pensar como que a gente poderia continuar movimentando os nossos conteúdos à distância, por conta da questão da distância. Mudamos um pouco o conteúdo do nosso canal nesses últimos meses, fizemos reactions, por exemplo”, relata Millah. Apesar da longa pausa nos conteúdos de KPOP IN PUBLIC da JJANG B, a líder do grupo conta que a produção dos vídeos estão voltando aos poucos. “No momento, estamos na produção de 2 vídeos, faremos a edição para logo postar no YouTube. As pessoas têm pedido muito para a gente voltar, só que a prioridade no momento é a nossa saúde e a saúde das pessoas. Voltaremos aos poucos, com poucas pessoas e com total segurança, além de aguardar que toda essa situação seja resolvida para que a gente possa voltar com tudo”, reforça Mariana. 

Confira o cover de “VERY NICE” do SEVENTEEN gravado pelo JJANG B

MOVE NATION – Bruxelas, Bélgica

K-Pop in Public MOVE NATION

Com cada integrante tendo tido o contato inicial com o k-pop de forma diferente – alguns são fãs recentes, enquanto outros já escutam os artistas a mais de 10 anos -, o Move Nation foi formado em 2016. Na época, alguns membros já faziam parte de grupos de cover de dança, mas também tinham aqueles que apenas dançavam em seus quartos. Com o desejo de fazer uma dança para “Hello Bitches” da CL, duas integrantes começaram a contatar alguns amigos e outras pessoas que viram em concursos para realizar o projeto. “Nós gostamos muito do resultado e decidimos continuar. Aí o grupo cresceu com o passar dos anos!”, contou Fanny, uma das líderes do grupo. Hoje, o canal no YouTube conta com mais de 130 mil inscritos e vídeos que já alcançaram a marca de 3 milhões de visualizações.

“A fanbase de k-pop na Bélgica é bem grande, o que é estranho para um país tão pequeno”, comentam. Os eventos no país são poucos e lojas com os produtos oficiais também, mas isso não desmotiva a união dos fãs, existe um grupo no Facebook que une um número grande de pessoas e antigamente era muito usado para organizar encontros. Algumas atividades de k-pop são organizadas pelo próprio Move Nation, por exemplo, o random play dance. “Todo mundo se conhece no fandom de k-pop ou pelo menos essa é a impressão”, afirma.

Para as locações do KPOP IN PUBLIC, a escolha é um pouco aleatória, porém, também depende de alguns fatores como quantidade de pessoas que estão no local, se elas já filmaram em determinado lugar ou não, por exemplo. Normalmente, o grupo anuncia antecipadamente no Instagram onde o desafio será gravado, para que os amigos e quem gosta do canal possam assistir a apresentação. “Nós organizamos esses desafios mais para nosso público do que para nós mesmas, não somos muito fãs de gravações de um único take.”, relata a integrante.

Em relação ao público, Fanny conta que os belgas são muito receptivos com as performances na rua. Na maioria das vezes, as pessoas se juntam ao redor do grupo para aplaudir quando a gravação termina. Muitos são os curiosos que fazem perguntas e alguns fãs do canal que as reconhecem, no entanto, ainda existem alguns pontos negativos: incivilidade, pessoas interrompendo ou, às vezes, elas são confrontadas com assédio nas ruas, através de insultos à aparência física das meninas e outras palhaçadas.

Na hora de aprender as coreografias, algumas são fáceis de aprender, mais lógicas, enquanto que outras requerem mais concentração e coordenação. “Nossa dica seria filmar cada ensaio, ver exatamente o que está errado, anotar e trabalhar nisso em casa. Às vezes colocamos o vídeo de ensaio e o vídeo original lado a lado pra ver onde estão nossos erros. Não tem segredo, só trabalhando para ter um bom resultado”, conta. Segundo ela, uma das coreografias mais difíceis que elas aprenderam foi “Can’t You See Me?” do TXT, pois foi bastante difícil de coordenar.

Para o grupo, a influência da cultura coreana não fica somente no k-pop, muitas amam os dramas e filmes coreanos. “Muitas das garotas também já foram para a Coreia do Sul, incluindo a Aaliyah que ganhou o concurso do WishGirls e pôde ir para Seoul gravar um videoclipe com elas”, finaliza Fanny. 

Confira o cover de “HIP” do MAMAMOO gravado pelo MOVE NATION

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