Cantora britânica antecipou o lançamento do segundo álbum da carreira por conta de seu vazamento: “não sei se é o certo a se fazer”
Poucos fatos são tão claros na música quanto a crença de que a nostalgia vende. Este mantra se faz verdade na só na quantidade de artistas, grupos musicais e bandas que retomam suas carreiras após longas pausas e lotam estádios, mas também no carinho que todo mundo nutre por hits dos anos setenta, oitenta e noventa, mesmo sem ter vivido estes anos. Um exemplo disso é a quantidade de millennials que enchem a boca para dizer que nasceram na década errada, e se orgulham de dizer que escutam Beatles, ABBA e Bee Gees, entre outros hit makers das últimas décadas.
Ciente disso, e decidida a não ser lembrada como one-hit-wonder pelo smash “New Rules“, Dua Lipa transformou este fato em conceito no seu segundo álbum de estúdio, Future Nostalgia, que chega nas plataformas de streaming de forma antecipada nesta sexta-feira, (27). Trabalho tinha lançamento previsto para o dia 03 de abril, mas devido ao seu vazamento foi reagendado para esta semana. Em live no Instagram, a também modelo de origem albanesa revelou que não sabia se essa era a atitude correta a se tomar, mas que queria que os fãs tivessem momentos de alegria durante a pandemia do vírus COVID-19.
A verdade é que a cantora sabia que tinha um grande desafio pela frente em superar o sucesso de seu debut homônimo de 2017 que chegou no topo das paradas da Billboard e por lá permaneceu por incríveis 41 semanas. Apesar de ainda novata no mundo da música, Dua conseguiu, com seus incontáveis recordes, provar seu talento e potencial para “peitar” de frente grandes nomes da música pop como Lady Gaga, Katy Perry e Taylor Swift.
A primeira coisa que Future Nostalgia deixa claro é que este é um álbum puramente comercial. Pensado minuciosamente e planejado estrategicamente para “hitar” em uma época de vacância onde não há um grande nome ou uma detentora do título de salvadora da música pop. Trabalho também conta com um time de peso na produção, como Jeff Bhasker, Ian Kirkpatrick, Stuart Price, Danja, The Monsters e Strangerz, entre outros nomes. Ao adotar o conceito retrofuturista, Dua promete um álbum dançante, apaixonante e revolucionário.
Os primeiros passos da era já indicavam que o conceito abordado seria um tanto quanto visual, de forma a levar seu ouvinte em uma viagem pela música pop através do tempo. Isso foi expressado com precisão no estilo da cantora que adotou mechas loiras – bastante usadas no início dos anos 2000 – na capa do lead single “Don’t Star Now“. A faixa dançante com claras influências da disco music oitentista trouxe grandes expectativas para seus próximos passos, além de um prato cheio sobre o conceito que o esperava. Era impossível encarar as fotos promocionais sem pensar “isso é tão Malhação anos 2000″.
A primeira canção de divulgação foi um hit certeiro para dar início ao hype do que seria o afago da música pop. Hype este que foi reafirmado no segundo single, “Physical“, que além de fazer referência para o hit de Olivia Newton-John, de 1981, explora com maestria elementos da disco music, do synthpop, new wave e R&B, não coincidentemente se tornando a melhor música do álbum. O vídeo não é diferente e traz uma onda de cores, visuais bregas, danças e estilos que reforçam o conceito retrofuturista. Fica clara a missão de Dua Lipa de te fazer viajar pelos anos 80 e 90. “Physical” é, sem a sombra de dúvidas, um smash hit grandioso que serviu para aumentar a fome dos fãs pelo álbum. O sucesso da música levou a cantora a brincar ainda mais com o conceito retrowave e divulgar o “workout video” da canção, inspirado em programas televisivos para videocassete dos anos 80, reforçando a inspiração no hit de Newton-John e a desenvoltura no conceito prometido.
Future Nostalgia
Como já mencionado anteriormente, a produção de Lipa trabalhou estrategicamente e minuciosamente para criar um álbum que seria revolucionário para consagrá-la como o novo grande nome do pop mainstream. Talvez o único erro de Dua tenha sido promover as duas melhores músicas como single de um álbum que é, na verdade, morno. Future Nostalgia é um bom álbum, mas não traz nenhuma surpresa tão incrível quanto os singles entre as faixas não divulgadas. Desta forma, é impossível ouvi-lo em sua totalidade sem sentir o “gostinho de quero mais”.
O trabalho é introduzido pela canção que dá nome ao álbum, que explora batidas oitentistas de disco e R&B com fortes referências de hip-hop e soul, ambos gêneros consagrados na consagrada década. Esta é talvez a faixa mais criativa e bem trabalhada no intuito de entregar a atmosfera planejada. Canção é seguida pela também já conhecida “Don’t Start Now”, que dá continuidade no ritmo dançante e conciso do álbum.
“Cool” continua trabalhando o antigo pop com batidas e samplers suaves menos dançantes, e é seguida pela já mencionada música mais forte deste trabalho, “Physical”. “Levitating” também é uma agradável surpresa que mantém a atmosfera retrô da dance music.
As coisas começam a desacelerar em “Pretty Please“, que soa bastante como o tipo de canção que a Mariah Carey faria no início do século. “Hallucinate” retoma a dance com força total e é outra ótima surpresa, embora nenhum pouco ambiciosa e sem momentos especiais.
É interessante como Dua Lipa se apropria do gênero dance como se fosse a principal tendência da atualidade, e como se de fato estivéssemos vivendo o auge da década oitentista. Isto torna-se perceptível em “Love Again“, que trabalha bem o instrumental, e no último single “Break My Heart“, que além de excelente, poderia ter sido um smash hit da Jennifer Lopez há quase duas décadas. “Good in Bed” é agradável e explora o R&B a ponto de lembrar muito as composições de Amy Winehouse e ao mesmo tempo é exatamente o tipo de música que você esperaria encontrar no álbum Alright, Still (2006), de Lily Allen. “Boys Will Be Boys” conclui o trabalho de forma desproporcional, fugindo completamente da atmosfera construída ao longo do álbum. Por outro lado, seus versos arrebatadores são capazes de quase se fazer esquecer o fato de que todas as músicas falam sobre homens e relacionamentos.
Criar atmosferas experimentais como Dua cria em Future Nostalgia é sempre um risco, uma vez que a tendência só pode ser validada pela aceitação do público. Como dito anteriormente, a nostalgia vende. De certa forma, a voz de Dua Lipa também permite brincar com estilos e se encaixa perfeitamente na atmosfera proposta. As canções pouco ambiciosas do álbum cumprem o papel de dar continuidade no clima anos 80, sem fazer questão de serem muito complexas ou lembradas como grandes hits. É como se a cantora entregasse o álbum e dissesse: “Toma, gay. Vai dançar. Este é o conceito“.
Future Nostalgia é um álbum que cumpre o que promete ao proporcionar uma experiência nostálgica para um público muito novo para curtir grandes divas do pop no início de carreira, como Cyndi Lauper, Bonnie Tyler, Tina Turner, Gloria Gaynor, Madonna, Kylie Minogue e Jennifer Lopez. É também bastante fiel a proposta, sem fugir para sons contemporâneos e autêntico, uma vez que Dua foi uma das primeiras artistas a adotar o conceito retrowave e transformá-lo tendência antes de tornar-se saturado. É um prato cheio de “farofa” para um público que esperava ansiosamente por alguém que chegaria e traria novos ares para a música pop, tal qual Lady Gaga com Born This Way, em 2011.
Neste trabalho, Dua Lipa prova mais uma vez que seu sucesso é fruto de seu talento e que está apenas no início de uma carreira que promete ser sólida e grandiosa. Future Nostalgia deixa dúvidas e divide opiniões sobre ser tão grande e melhor quanto o debut autointitulado de 2017, mas entrega o que foi proposto e satisfaz aqueles que aguardavam ansiosamente seu retorno. Contudo, deixa o sentimento de “quero mais” naqueles que esperavam muito do trabalho, andando de mãos dadas com a curiosidade sobre quais serão seus próximos passos.
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