Decepções, criatividade e a narrativa sombria de The Weeknd em 2020

Do personagem sangrento ao desprezo do Grammy, Abel Tesfaye viveu um ano de grandes emoções – e se firmou como um dos maiores artistas da atualidade.
Do personagem sangrento ao desprezo do Grammy, Abel Tesfaye viveu um ano de grandes emoções – e se firmou como um dos maiores artistas da atualidade

Se o universo pop reinou em 2020, um dos maiores candidatos à coroa seria The Weeknd

O artista canadense estourou mundialmente em 2015 com o single “Can’t Feel My Face”, do álbum Beauty Behind the Madness, seguido por “Starboy”, colaboração com o Daft Punk para o disco de mesmo nome em 2016, ambos atingindo o topo da tradicional lista Hot 100 da Billboard – e repetiu o feito com “Blinding Lights”, lançada no finzinho de 2019, que além de tudo quebrou o recorde de maior número de semanas entre as cinco e as dez mais tocadas da parada musical. A faixa, carro-chefe do álbum After Hours, de 2020, também conquistou o posto de canção mais tocada no ano no Spotify, totalizando mais de 1,6 bilhão de reproduções pelo mundo. Mas esse não foi o único grande momento do artista no ano.

O conceito ousado de After Hours

Lançado em março de 2020, After Hours traz um pop marcado por fortes influências dos anos 1980 não apenas em sua sonoridade, mas também no trabalho visual que acompanha o projeto. A versão original do álbum não possui nenhuma colaboração especial, fazendo com que o foco seja total na voz – metafórica e literal – e no personagem de Abel Tesfaye: vestido com um conjunto amplo de terno vermelho, óculos quadrados, luvas de couro e um bigode chamativo, o protagonista desta era parece saído diretamente de um VHS do Martin Scorsese. 

O arco narrativo acompanha o personagem por uma noite especialmente ruim, começando lá no fim de 2019 com “Heartless”, em que ele se diverte com amigos em um cassino de Las Vegas. Em seguida, temos “Blinding Lights”, “After Hours”, “In Your Eyes”, “Until I Bleed Out”, “Snowchild” e “Too Late”, com The Weeknd aparecendo cada vez mais alucinado, ferido e fora de si – em muitos sentidos. Algumas das referências listadas pelo artista foram filmes como “Chinatown”, “O Rei da Comédia”, “Vestida para Matar” e, é claro, “After Hours” (“Depois de Horas”).

A narrativa visual extrapolou também para a vida real: o personagem de Abel marcou presença em (alguns dos poucos) tapetes vermelhos, premiações, capas de revista, e até mesmo apresentações em programas como os de Jimmy Kimmel e Stephen Colbert, que complementam a história contada nos videoclipes. Novamente, a cada aparição, mais sangue, faixas e curativos. 

Estrela virtual

Antes mesmo de After Hours sair oficialmente, The Weeknd já havia anunciado uma turnê de divulgação do álbum, que começaria em junho de 2020 e passaria por Europa e América do Norte. A pandemia fez com que os shows fossem remarcados e a equipe do artista até mesmo chegou a considerar adiar o lançamento do álbum, mas ele bateu o pé para apresentar o projeto ao público na data planejada. “As pessoas não podem ir a shows, mas eu não ligava,” Abel disse em entrevista à Variety. “Eu sabia como [o lançamento do álbum] era importante para os meus fãs”. 

Com a turnê fora de cena, como divulgar o trabalho de forma ampla e eficiente? As aparições do personagem em eventos da vida real foram uma grande parte disso. A outra solução foi se voltar para o outro extremo: o mundo virtual. Em junho, The Weeknd fez uma participação especial em um episódio do desenho “American Dad”, que ele também ajudou a escrever. Nos meses seguintes, a experimentação com animação continuou com os vídeos para o remix de “In Your Eyes”, com participação de Doja Cat, feito em animação 3D, e “Snowchild”, inspirado no estilo dos animes japoneses.

Em agosto, The Weeknd virou um avatar digital em um show interativo via TikTok, em que a audiência podia votar para escolher o que ele faria em seguida – como, por exemplo, lamber um sapo mágico. A chamada “The Weeknd Experience” chegou a dois milhões de espectadores únicos e ainda arrecadou 350 mil dólares para a Equal Justice Initiative, uma organização que luta contra o encarceramento em massa e injustiças econômicas e raciais nos Estados Unidos. 

Fãs também puderam interagir com um avatar de inteligência artificial do artista, criado em parceria com o Spotify, que analisava dados como há quanto tempo o usuário ouvia The Weeknd e em quais dias da semana – além de perguntar “Como vai?” e agradecer pelo apoio. 

Colaborações

Além da colaboração com Doja Cat, outras faixas de After Hours também ganharam remixes colaborativos, com versões de “Heartless” com o rapper Lil Uzi Vert, “In Your Eyes” com o saxofonista Kenny G, e “Blinding Lights” com a artista espanhola Rosalía. The Weeknd também colaborou fora do projeto em faixas como “Smile”, lançamento póstumo do rapper Juice WRLD,  “off the table”, do álbum positions de Ariana Grande, e em um remix de “Hawái”, de Maluma. 

Honras e premiações

Em 2020, The Weeknd levou as estatuetas de “Vídeo do Ano” e “Melhor Single R&B” por “Blinding Lights” no Video Music Awards da MTV, além dos troféus de “Álbum Soul/R&B” por After Hours, “Artista Masculino Soul/R&B”, e “Canção Soul R&B” por “Heartless” no American Music Awards. Nas duas premiações, o artista entregou performances espetaculares encarnando o personagem sombrio da era. 

Abel também foi eleito uma das 100 pessoas mais influentes do ano pela revista TIME, com um perfil escrito por Elton John. “Você nunca sabe com certeza se ele está cantando sobre si mesmo, ou se está em um personagem”, John escreveu. “Ele tem uma imaginação incrível”. O artista inglês também declarou que “‘Blinding Lights’ é o melhor single de 2020”. 

The Weeknd com os troféus do American Music Awards em novembro de 2020.

The Weeknd x Grammys

Talvez a maior decepção para The Weeknd e seus fãs tenha vindo em novembro, com o anúncio oficial da lista de indicados aos Grammys de 2021. Apesar de ter um dos trabalhos mais aclamados do ano – e da carreira –, o artista não recebeu uma indicação sequer ao prêmio, o que causou revolta geral entre público e colegas da indústria.

Nas redes sociais, Abel desabafou dizendo que “Os Grammys continuam corruptos. Vocês devem transparência a mim, meus fãs e à indústria…” Em outra postagem, ele escreveu: “Planejar colaborativamente uma performance por semanas para não ser convidado? Na minha opinião, zero indicações = você não foi convidado!” 

A única satisfação dada pela Recording Academy, responsável pela premiação, foi uma entrevista do presidente e CEO Harvey Manson Jr. à Rolling Stone. “Nós compreendemos que The Weeknd está decepcionado por não ter sido indicado”, disse. “Fui surpreendido e posso empatizar com o que ele está sentindo”.

De acordo com a revista e com o site TMZ, fontes anônimas declararam que Abel foi ignorado por conta de um suposto conflito sobre a possibilidade de se apresentar na premiação e no intervalo do Super Bowl de 2021. Apesar de as equipes terem chegado a um acordo e autorizado The Weeknd a se apresentar nos dois eventos, a especulação é de que a produção do Grammy teria se irritado com o vai-e-volta da discussão. Outro fator é o possível medo de ter performances idênticas, isso porque tanto a premiação como a final esportiva serão transmitidas com apenas uma semana de diferença no canal de televisão americano CBS. 

Apesar do baque, The Weeknd continuou se empenhando em seu trabalho, finalizando o ano com uma edição especial na revista britânica tmrw e uma apresentação no iHeart Radio Jingle Ball. E deve ter um 2021 bastante prolífico: além da apresentação no intervalo do Super Bowl em fevereiro, há a expectativa do início da turnê After Hours em Vancouver em junho – e, provavelmente, muitas outras novidades a caminho. 

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