Mais de uma década depois, os estadunidenses reencontram memórias deixadas no caminho, e brindam os fãs com um EP nostálgico e intenso
Revisitar o passado e se encontrar em meio a memórias antigas e, claro, momentos emblemáticos é algo que muitos artistas e, sobretudo, bandas costumam fazer no decorrer de suas carreiras. A mudança de caminho é algo corriqueiro por diversos motivos, mas se reencontrar após anos, é um exercício que com certeza merece notoriedade. O destaque da vez são os estadunidenses do The Devil Wears Prada, banda formada em 2005 na cidade de Dayton, Ohio. Com um boom no metalcore da época, figurando em diversos festivais e charts, a banda lançou seu primeiro EP temático em 2010, intitulado Zombie EP, onde tanto a ambientação, quanto as composições giram em torno de um cenário pós-apocalíptico, especificamente tratando-se de um apocalipse zumbi, o que voltou os olhos da mídia para a banda com ótimas críticas e posicionamentos.
Ao longo dos anos, idas e vindas dentro da banda, e apenas alguns membros da formação original ficando no cast, a banda lança outros trabalhos ainda se mantendo na zona do metalcore, mas experimentando e tentando encontrar um novo horizonte dentro do próprio lar. Após o último álbum The Act, lançado em 2019, a banda toma só última forma com a entrada oficial de Giuseppe Capolupo assumindo as baquetas, Mason Nagy no baixo e Jonathan Gering fidelizando os sintetizadores e os teclados da banda, algo que não era oficial na banda desde 2012 com a saída de James Baney.
2021, onze anos depois do Zombie EP, a banda anuncia e vem a luz a parte dois, batizada de ZII que causa exatamente esse reencontro com as raízes e entrega um The Devil Wears Prada forte, novamente convicto e certo do caminho que quer se entregar mais uma vez. A equipe do ROCKNBOLD ouviu o disco, e o resultado vocês podem conferir logo abaixo:
“Nightfall” abre o disco com o os vocais guturais de Mike Hranica e já define o tom de como será a jornada a partir dali, linhas essas que remetem ao clássico,With Roots Above And Branches Below, álbum que sacramentou o nome da banda no cenário. Notável também é quão multifacetada a faixa é, transitando por diversos gêneros. Os vocais limpos de Jeremy auxiliam na atmosfera sombria enquanto as letras exploram a ansiedade e antecipação de um possível encontro contra os mortos-vivos. Antes da faixa acabar, o ouvinte já estará cantando o questionamento levantado aqui “Can you make it til dawn?”.
Se no decorrer dos anos a banda flertou com diversos estilos musicais em seus discos, é possível ver uma maturidade renovada onde o peso balanceia perfeitamente o melódico e “Forlorn” é um excelente exemplo disso, seja na justaposição de ambos os vocais, no breakdown introduzido na metade de sua duração ou até mesmo no peso dos sintetizadores que iniciam a faixa. Destaque para os vocais e as linhas líricas do guitarrista e backing vocal Jeremy DePoyster, trazendo harmonia em meio ao caos apocalíptico que o enredo aborda.
“Termination”, lançada como o single de anúncio do EP, leva o título de a mais pesada e também mais repetitiva do disco, e isso não é um problema. Remanescente da abordagem que popularizou Knocked Loose, essa estrutura musical produz uma antecipação antes de retornar ao riff principal que carrega a música e é o modus operandi aqui, detalhe para a quebra do compasso feita com os pratos da bateria que trazem uma certa estranheza muito bem-vinda. Também é possível ver claramente a presença do tecladista Jonathan Gering, colocando os synths pra cantar em meio as linhas e zerões dos riffs da música.
“Nora” é o suprassumo de tudo aquilo que o The Devil Wears Prada representa. Nela o instrumental cresce a partir de um VS, e é coroada com a performance impecável de Mike nos vocais. A faixa consiste em ilustrar o completo esgotamento físico e mental da protagonista, assim, os pedais duplos tomam o protagonismo juntos de um lead que parece ser tirado de um álbum de black metal até a chegada do refrão que deixa esse protagonismo nos vocais limpos e baixo, é como sair de um pico de adrenalina assustador e mergulhar na desesperança. Notável também é o detalhe nas letras, que quando atinge o trecho em que se menciona “tired eyes…”, Hranica utiliza de uma voz mais ofegante.
A faixa que fecha o disco, “Contagion” é um alento para os fãs de longa data da banda. Além de também fechar o storytelling do disco, a banda fez questão de colocar o lírico como objeto principal da música refletindo sobre a dificuldade de se manter são em quanto tudo se desmorona rapidamente ao nosso redor. O campo harmônico utilizado pela banda nos joga mais uma vez para 2009, transcendendo o gênero para algo palpável e sinestésico. O breakdown da música é um dejavu de anos, e o final, algo magistral com direito a queda e ascensão dentro do mesmo compasso.
Após 11 anos e uma pandemia, The Devil Wears Prada revisita a jornada começada no Zombie EP, mas não fala apenas com o lado nostálgico, ZII pega exatamente onde seu antecessor parou. Tanto no peso das faixas, quanto no desenvolvimento dos sentimentos que um apocalipse pandêmico pode causar. As letras aqui escritas dialogam com o que vivemos hoje, diretamente. Seja nos medos que a pandemia nos trouxe, a solidão e desesperança que o isolamento nos provocou. ZII faz com que a narrativa, que outrora era mais familiarizada em universos de games e filmes, converse com nossos sentimentos. É um disco que traz o peso e melodia pelos quais foram conhecidos, enquanto retoma e desenvolve uma narrativa iniciada há mais de uma década. Com todas essas facetas, o EP se coloca na discografia do grupo como uma inevitável progressão e crescimento sonoro, demonstrando que o melhor feito dentro de todo o tempo de sua duração é abraçar o passado do grupo sem ignorar o presente. Logo abaixo, o EP na íntegra pra vocês sacarem o lance!