“Sam’s Town” e a mudança de sonoridade do The Killers

Inicialmente odiado pelos críticos e sempre amado pelos fãs, álbum clássico do The Killers completa 15 anos.

Em 2004, o The Killers conseguiu a atenção dos Estados Unidos e do Reino Unido com Hot Fuss, primeiro álbum da banda de Las Vegas. O visual glamoroso e cheio de sintetizadores chamou a atenção do público que até hoje canta a plenos pulmões hits como “Mr. Brightside” e “Somebody Told Me”. Dois anos depois, o grupo precisou passar pela prova de fogo do segundo álbum e o resultado veio com Sam’s Town.

Em 2006, a cena do indie rock ganhava novos rostos e grupos mais antigos também retornavam com novos trabalhos. Arctic Monkeys, The Kooks e The Raconteurs lançavam seus álbuns de estreia enquanto The White Stripes retornava com Get Behind Me Satan e Muse com Black Holes and Revelations. No meio desses nomes, The Killers tomava a decisão de mudar sua sonoridade, abandonando o lápis de olho e adotando bigodes para a nova representação visual do grupo.

The Killers durante a turnê do álbum

Enquanto Hot Fuss se inspirava principalmente nas bandas inglesas favoritas de Brandon Flowers, Sam’s Town se encontrou na música norte-americana. É o primeiro álbum do The Killers em que o vocalista tenta compor e cantar como Bruce Springsteen, trazendo a realidade dos Estados Unidos para suas letras e performances. Porém, mesmo abandonando as influências de seu primeiro trabalho, Sam’s Town utiliza um elemento bastante encontrado nas faixas de New Order, The Smiths e até dos Beatles: usar a cidade em que a banda vive como elemento central das canções.

Na época do lançamento de Sam’s Town, Flowers afirmou que a obra seria o melhor álbum de rock em décadas e que iria manter o rock vivo. No entanto, o álbum recebeu inúmeras críticas negativas. De acordo com a review da NME, o The Killers se levou a sério demais e tudo era muito cliché. Para a Rolling Stone, o álbum mereceu apenas duas estrelas.

Entretanto, críticas negativas não abalaram Brandon Flowers. Sam’s Town é o trabalho que encapsula tudo o que ele viveu até aquele momento e é a representação de toda a sua confiança. A banda mostra isso logo na primeira faixa, que abre o álbum de maneira explosiva e serve como uma transição entre o The Killers de 2004 e o novo som que o quarteto queria mostrar. Ao cantarem “I see London, I see Sam’s Town”, eles concretizam que estão deixando de lado a inspiração britânica e focando nos problemas reais de Las Vegas.

O nome do álbum vem da própria cidade da banda. Sam’s Town é um cassino de Las Vegas, mas longe de ser um dos mais famosos da cidade. Na época, ele era considerado velho, sujo e sem possuir qualquer luxo, da mesma forma que as histórias contadas por Brandon nas 12 faixas. Pegando um pouco da ideia dos Beatles quando homenagearam Penny Lane, The Killers decidiu mostrar a Las Vegas que viveram antes da fama, com o cassino ficando perto da rua em que Flowers morava.

Na temática do cassino, “Enterlude” e “Exitlude” brincam com a ideia de se hospedar no local através das canções. Durante a gravação do álbum, a banda ficou em um hotel que possuía um piano a disposição do grupo. Tentando compor, Brandon usou do cenário ao seu redor como inspiração. A chave do quarto possuía a mensagem “we hope you enjoy your stay”, que ele fez questão de colocar nas duas faixas.

Na sequência, “When You Were Young” é a música que transformou o The Killers de um grupo de indie rock com alguns hits, para uma banda de shows em estádios enormes. Tanto que logo em seu segundo álbum, eles assumiram o posto de headliners de grandes festivais, incluindo o Glastonbury.

Em “Bling”, a figura do pai do vocalista é apresentada, com ele servindo de exemplo sobre como lidar com o fracasso. A faixa serve como um olhar para o passado, com tudo o que o pai do Brandon viveu para criar os seis filhos. Ele nos lembra que é muito fácil você perder o foco e o sentido da vida, mas que permanecer em família sempre nos fortalece.

“For Reasons Unknown” e “Bones” mostram a sonoridade anterior da banda. Brandon as descreveu como pontes entre Hot Fuss e Sam’s Town. Curiosamente, mesmo não representando o The Killers de 2006, as duas faixas foram escolhidas como single do álbum, com direito ao clipe de “Bones” ser dirigido por Tim Burton. Sobre a escolha de diretor, eles contaram que Burton costumava visitar Las Vegas na infância e que a visão dele da cidade chamou a atenção do grupo.

Por anos sendo considerada pela própria banda como a melhor canção do grupo, “Read My Mind” conta a história de Flowers antes de Las Vegas, de quando morou em uma pequena cidade no estado de Utah. Descrita pelo músico como uma cidade tão pequena que nem sinal de trânsito possuía, Nephi ficou imortalizada como a “two-star town” da faixa. Uma curiosidade é que por muito tempo a música possuía outro nome. “Little Angela” era o nome original, mas o produtor da banda achou que parecia muito com “Mrs. Robinson” de Simon & Garfunkel e os convenceu de que era uma boa ideia mudar para “Read My Mind”.

Tornando a experiência do álbum ainda mais pessoal, “Uncle Jonny” de fato conta a história de Jonny, tio de Brandon. A letra retrata o vício em drogas do irmão da mãe do vocalista e que, mesmo sempre causando problemas, ele era uma boa pessoa. Em entrevista, Flowers contou que o tio adorou a homenagem, pois sempre foi fã de rock.

“My List” é o mais próximo de uma balada que o álbum possui. Em 2005, Brandon se casou e desde então usa usa esposa como fonte de inspiração para suas composições. Sobre “My List”, ele contou que é uma carta de amor para a pessoa que ele mais ama. Enquanto isso, “Why Do I Keep Counting?” e “This River Is Wild” podem ser interpretadas como diálogos de Flowers com Deus. Nas duas faixas, ele reflete sobre a natureza finita da vida humana, os erros e acertos que podemos cometer, mas sempre buscando redenção.

15 anos depois, The Killers já passou por diversos altos e baixos na carreira, no entanto, todos os fãs concordam que Sam’s Town já pode e deve carregar o título de clássico do rock. A obra ainda consegue passar a sensação de ser uma carta aberta de Brandon para sua família e Las Vegas. No final, podemos afirmar que o então jovem vocalista não estava errado ao pensar grande em relação ao álbum.

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