Terceiro álbum de estúdio da rapper marca sua “aposentadoria” do mundo da música
A australiana Iggy Azalea tinha apenas 16 anos quando embarcou rumo aos Estados Unidos sob a desculpa de que iria “só tirar umas férias”, em busca de realizar o sonho de se tornar uma estrela do rap. Vítima de bullying na escola, a artista encontrou no hip-hop uma paixão e válvula de escape e conseguiu levar sua música ao topo das paradas globais, tornando-se conhecida mundialmente. Agora, aos 31 anos, ela (supostamente) encerra esse capítulo com The End of an Era, seu terceiro álbum de estúdio.
O “fim de uma era” ao qual ela se refere é, em parte, a transição dos 20 para os 30 anos de idade, mas é também, principalmente, sobre sua aposentadoria do mercado musical – ou melhor, uma pausa, já que a própria Iggy admite que existe a possibilidade de ela voltar a trabalhar com música em “mais ou menos dois anos”. Mas, por enquanto, a artista mantém que o disco é, realmente, seu último trabalho em estúdio e que, daqui para frente, ela quer focar em outros projetos criativos.
Para marcar essa despedida, a rapper refletiu sobre tudo que viveu na última década, desde sua ascensão meteórica na época do álbum de estreia The New Classic (2014), passando por sua experiência recente como mãe. O disco é, assim, uma espécie de cápsula do tempo dividida em quatro partes (ou eras), buscando inspirações dos 20, 24, 28 e 30 anos de Iggy.
A rapper misturou referências que vêm de sua mixtape de 2012, Trap Gold, o pop mainstream de suas colaborações de 2014, a agressividade e os 808s de In My Defense (2019), e sons que a influenciam hoje em dia. O resultado é uma infusão de EDM com pitadas de pop amarradas pelo rap áspero característico de Iggy. Segundo a própria, o disco pode ser descrito em três palavras: “Miami, trashy, eletrônico”.
Em entrevista à Billboard, a artista disse que as batidas eletrônicas são as que mais a inspiram para criar música, então a intenção era realmente passar a sensação da diversão de estar curtindo em um clube. Nesse sentido, o álbum é coeso, com faixas que conversam entre si e poderiam até mesmo fazer parte de uma única música de 38 minutos.
Ainda assim, são poucos os momentos verdadeiramente empolgantes. A produção de AJ Ruined My Record, Jay Scalez e J. White Did It funcionou muito bem e é notável a evolução no flow de Iggy, por tantos anos alvo de críticas (e piadas). Mas liricamente, o disco tem uma narrativa confusa, com jogos de palavras que às vezes não parecem fazer muito sentido transpostas em sons que remetem muito ao que se ouvia no mainstream de meados dos anos 2010 – um período ainda recente demais para ser nostálgico.
O álbum realmente parece uma festona em Miami com momentos de sexo, drogas e ostentação. “Sirens” abre o trabalho de forma promissora com uma batida pesada, mas é seguida pela tímida “Brazil”, em que Iggy de certa forma retribui o carinho dos fãs brasileiros, que ela considera os mais animados. A faixa, inclusive, ganhou um remix mais interessante com participação de Gloria Groove.
“Emo Club Anthem” talvez seja uma das mais fracas em termos de letra. Iggy explicou no Twitter que a faixa é sobre usar drogas como consolo e distração para não ter que lidar com sentimentos ruins, mas isso não transparece muito bem no produto final.
Por outro lado, a rapper acertou em cheio com “Iam The Stripclub”, quase um hino sobre se divertir e aproveitar o agora sem se importar com o que vem depois, e “Sex On The Beach”, colaboração com Sophia Scott voltada para um pop mais relaxado e que poderia facilmente aparecer na programação de rádios como aconteceu com “Fancy” e “Black Widow” em 2014.
Iggy faz uma boa escolha ao fechar o álbum com “Day 3 In Miami (End of an Era)”, com participação de Ellise. Do ponto de vista sonoro, é uma faixa mais difícil de agradar a um grande público, mas é a que traz letras mais vulneráveis, com a artista falando que “a festa tem que acabar” e apontando até um burnout: “Eu estava empolgada, agora isso me desanima.”
The End of an Era pode ser considerado um dos trabalhos mais experimentais da carreira de Iggy Azalea. É importante lembrar que, diferente de quando lançou The New Classic, a artista hoje é independente, o que faz com que a divulgação e propagação do trabalho seja mais difícil e, por isso, o lançamento é uma jogada até mesmo arriscada (o álbum ainda não ganhou resenhas nas maiores publicações musicais e nem sequer está listado no Metacritic).
Mas o que poderia ser uma forma de consolidar o legado da rapper e “encerrar” sua carreira de forma triunfal acabou resultando em um disco pouco marcante. Ainda mais considerando a ascensão de uma forte nova geração do rap feminino, com nomes como Megan Thee Stallion, Saweetie e até mesmo BIA, que rouba a cena na faixa “Is That Right” – e fazem com que Iggy pareça parada no tempo. A maior decepção? Se esse não fosse o último disco da artista, certamente veríamos uma evolução ainda maior de seu trabalho pela frente.