Madonna e o legado dos quase 40 anos de carreira da Rainha do Pop

Ícone entre gerações, Madonna completou no último sábado, (18), 62 anos; entre gramofones do Grammy e Globos de Ouro, a “Rainha do Pop” tem uma das maiores carreiras da história da música e o ROCKNBOLD conta toda sua trajetória neste especial da artista!

No dia 16 de outubro, uma das vozes mais importantes do pop por décadas, Madonna, completou 62 anos. Ao longo dos seus 37 anos de carreira, a cantora, compositora, atriz e empresária vendeu mais de trezentos milhões de discos, ganhou nove gramofones do Grammy, dois Globos de Ouro, 20 MTV Video Music Awards e foi introduzida ao Rock & Roll Hall of Fame em 2008.

Com quatorze álbuns de estúdio lançados, Madonna carrega merecidamente o título de Rainha do Pop. Além de sua obra revolucionar a indústria da música, ela se tornou uma inspiração para milhares de pessoas ao redor do globo. Tratando de temas como direitos dos LGBTs e empoderamento feminino tanto dentro quanto fora dos palcos, a cantora chega aos 62 anos como um ícone para diversas gerações.

A década de 80

“What do you hope will happen, not only in 1984 but for the rest of your professional life? What are your dreams? What’s left? ”

 “To rule the world. ”

Trecho da entrevista com Dick Clark logo após sua primeira apresentação na televisão americana.

Com o lançamento do seu primeiro trabalho em 1983, Madonna já passou a ocupar o centro das atenções. Depois de participar de vários projetos e vivenciar a cena nova-iorquina, a cantora se dirigiu ao mundo através do pop. Músicas como “Holiday” e “Borderline” são clássicos de sua carreira e, junto com “Everybody”, a apresentaram para o público com seu dance-pop animado e com versos pegajosos. Mesmo sendo um disco simples da década de 80, com uma produção não muito elaborada, ele já se mostrou uma artista que tinha sede pelo sucesso, curtindo cada etapa para chegar no topo da fama.

No ano seguinte, a cantora explorou mais a sonoridade de seu álbum homônimo com a ajuda de Nile Rodgers e Stephen Bray, resultando no clássico “Like a Virgin”. O trabalho se tornou relevante ao não somente elevar Madonna ao nível de popstar mundial, mas também por ter apresentado as primeiras polêmicas da artista.  Na época, ela ainda era reconhecida pela sua voz doce e rosto de mocinha, no entanto, essa percepção do público mudou em setembro de 1984. Dois meses antes de lançar a faixa-título como single, ela se apresentou na primeira edição do VMA.

O evento anual da MTV teve Madonna como a primeira atração da noite e sua performance impactou todos os telespectadores. Não somente pelo fato dela ter cantado “Like a Virgin”, uma música que sozinha já era muito ousada para a época por mostrar uma mulher explorando sua sexualidade e brincando com o sentido do que é sagrado e o que é pecado, mas também toda a forma que ela conduziu sua apresentação. A ideia era simples, somente a cantora no palco, o cenário de um bolo de casamento e um vestido de noiva.  Porém, ela ainda adicionou elementos como acidentalmente começar a se despir e simular uma masturbação enquanto cantava “it feels so good inside”

O resultado que poderia ter sido catastrófico para sua carreira acabou catapultando seu sucesso. O disco “Like a Virgin” foi lançado em novembro do mesmo ano e hoje acumula mais de vinte milhões de cópias vendidas. A “The Virgin Tour” impulsionou a Madonna Mania, levando as meninas da época a usarem saias curtas, meias arrastão, crucifixos e o mesmo corte de cabelo da artista. Além desse single, o álbum também teve o hit “Material Girl” que contou com um dos clipes mais emblemáticos de sua carreira ao invocar Marilyn Monroe e “Into The Groove” que entrou na versão internacional do LP.

Agora como uma grande estrela internacional com dois álbuns e uma turnê de sucesso, qual seria o próximo passo de Madonna? Com o objetivo de encantar um público mais adulto, a artista passou a trabalhar num disco que fugisse da sonoridade de seus trabalhos anteriores. Assim, nasceu “True Blue”, considerado o primeiro momento de reinvenção de sua carreira. Essa mudança veio primeiro em seu visual, com ela de cabelo curto e loiro platinado e depois na sonoridade de suas músicas.

O primeiro single foi “Live To Tell”, faixa que já mostrava sua mudança musical por abandonar sua voz delicada e adotar um tom mais grave. Recém-casada com Sean Penn, faixas como esse single apresentaram o lado mais pessoal de Madonna ao público, pois ela colocou em evidência suas preocupações dentro do relacionamento e declarações de amor infinitas ao cantar “I searched the whole world for someone like you” no single “True Blue”. Também foi a primeira vez que a norte-americana abandonou o pop e flertou com a música latina em “La Isla Bonita”.

Se as pessoas achavam que as polêmicas da artista iriam parar após o VMA, elas estavam muito enganadas. A canção “Papa Don’t Preach” abriu o disco e foi muito criticada por possuir uma letra que exaltava a gravidez na adolescência. Entretanto, para Madonna, o significado da música era outro. Ela não queria apoiar nenhuma ideologia pró escolha, era só uma artista querendo ensinar seu público que mulheres também podem ser independentes e que podem tomar decisões grandes em suas vidas sem precisarem da opinião dos outros. Já em “Open Your Heart” o problema veio no clipe, em que a cantora se apresenta de forma muito sexy para uma criança. Na época, a MTV teve medo de passar o clipe, mas depois entendeu que era a forma de uma mulher livre se expressar.

Fechando a década, Madonna lançou seu trabalho mais emblemático, provavelmente o mais importante álbum lançado por uma mulher devido ao seu valor histórico. Antes de entender devidamente o disco, é preciso analisar o contexto em que ele surgiu. No final da década de 1980, a AIDS era um assunto controverso, onde muitos acreditavam que era uma doença enviada por Deus para castigar a comunidade LGBT. A violência policial contra negros não era evidenciada da mesma forma que é hoje. Mulheres que ousavam eram vistas apenas como vagabundas. Levando tudo isso em conta, podemos analisar melhor o impacto de sua obra de 1989.

Primeiro veio o lançamento de sua campanha publicitária com a Pepsi, em um acordo milionário, a artista apresentou o primeiro single de seu novo trabalho em uma propaganda. Contudo, no dia seguinte, Madonna pararia de ser vista somente como uma cantora pop polêmica, mas se tornaria uma figura além disso. No dia 3 de março de 1989, “Like a Prayer” estreou na MTV causando o choque de vários religiosos fundamentalistas e membros conservadores da sociedade.

O vídeo da Pepsi a fez lucrar cinco milhões de dólares e mostrava uma visão muito alegre da música, com Madonna cantando entre crianças. Já no verdadeiro clipe da música, a artista apareceu entre diversos símbolos religiosos. Dentro de uma igreja, ela pede apoio a Deus após ter visto uma mulher ser assassinada e um homem negro levar a culpa – mais tarde o homem retorna ao clipe como Jesus e a beija. Além disso, a própria aparece dançando com cruzes pegando fogo ao fundo, uma referência à Ku Klux Klan enquanto é acompanhada por um coral gospel cantando junto com ela.

A direita religiosa fez de tudo para que a visão geral do público fosse a de que Madonna era uma herege, fazendo até com que seu contrato com a Pepsi fosse encerrado. Entretanto, o clipe segue sendo um dos mais aclamados da história, mesmo após décadas de seu lançamento. A música em si se tornou um hit presente em todas as suas performances, é um hino espiritual para os seus fãs.  Ainda engajada socialmente, o single “Express Yourself” se tornou um símbolo de empoderamento tanto para mulheres quanto para a comunidade LGBT.

Utilizando da sua fama para promover uma boa causa, dentro do disco “Like a Prayer” o ouvinte encontrava um folheto com informações sobre a AIDS e a frase “Aids Is No Party! ”. Enquanto a mídia, escolas e a Igreja se mantinha longe desse assunto, Madonna informou muitas pessoas sobre a doença, mesmo com a chance de ter sua carreira destruída por causa disso.

A década de 90

Em 1990, sua carreira tomou novas proporções após o lançamento de “Vogue” e a turnê “Blond Ambition Tour”. O primeiro foi um single que entrou na trilha sonora do filme “Dick Tracy” e recebeu um clipe dirigido pelo David Fincher. Com a música, ela levou o vogue dos ballrooms para todas as casas norte-americanas. No vídeo, ela apresentou diversos dançarinos/coreógrafos da comunidade do “House Ball” do Harlem para o mundo. Depois, eles a acompanharam em sua turnê.

 Iniciada em abril daquele ano, a terceira excursão da cantora reinventou – aliás, essa palavra aparece muito em sua carreira – a forma de produzir shows. Em uma mistura de teatro, moda e performance artística, Madonna dividiu seu show em atos, cada um com um figurino, uma persona e figurinos. Porém, mesmo sendo um show animado, com uma mensagem legal de união, ele sofreu algumas críticas. Em Toronto, a polícia apareceu querendo impedir a realização do espetáculo por conta do conteúdo sexual de sua performance durante “Like a Virgin”. Na Itália, o show foi boicotado pelo Papa João Paulo II que afirmou achar tudo muito obsceno. Os detalhes desse período de sua carreira foram eternizados no documentário “Na Cama com Madonna” (1991).

Mais uma vez rompendo tabus, em 1992, foi lançado “Erotica”, seu quinto álbum de estúdio. Após perceber que grande parte da sociedade a considerava contra a moral e os bons costumes, Madonna entendeu que poderia usar disso para intensificar ainda mais sua imagem de mulher forte, independente e que sabia incomodar os conservadores. Primeiro veio o clipe de “Justify My Love” ainda em 1990, uma parceria da Rainha do Pop com Lenny Kravitz que rendeu no banimento do vídeo na MTV por estimular fantasias sexuais. Gostando da nova polêmica, ela decidiu explorar cenas de fetiches e sadomasoquismo no seu trabalho seguinte.

“Erotica” veio ao mundo em outubro de 1992 e no dia seguinte ao seu lançamento veio “SEX”, o ensaio fotográfico em que Madonna incorporou a personagem sadomasoquista de Dita Parlo. Apresentando sua sexualidade da forma mais explícita possível, seu alterego brincava de ser uma mulher despreocupada com a vida e que só pensava em realizar seus desejos sexuais. Ousado e controverso demais para a sua época, o álbum foi o primeiro fracasso comercial da artista, vendendo menos de dez milhões de cópias.

Ciente das críticas que seu trabalho recebeu e tentando voltar para o protagonismo comercial do pop, ela decidiu embarcar em uma era de baladas, focando mais em sua voz do que em provocações. O resultado foi “Bedtimes Stories” que contou com o hit “Take a Bow”, responsável por fazer com que a artista conseguisse o papel principal em “Evita” (1996) dois anos depois. A Rainha do Pop queria pleitear uma vaga no filme e aproveitou o videoclipe de seu single para isso.

O vídeo possui um clima espanhol, com uma tourada como pano de fundo e, depois, ela enviou uma cópia da gravação para o diretor Alan Parker como sua audição para interpretar Eva Perón. Mesmo já tendo participado de outros seis filmes, Madonna ainda visava os grandes prêmios como atriz. Como a primeira-dama argentina, ela levou o Globo de Ouro, no entanto, não chegou a ser indicada ao Oscar.

Depois de se aventurar em um musical, a cantora seguiu em sua fase comportada e lançou “Ray Of Light” em 1998, uma luz no pop que estava sendo dominado por nomes jovens. Aos 40 anos, Madonna se reinventou mais uma vez, principalmente, devido à maternidade e sua relação com a Cabala, resultando em um de seus trabalhos mais sinceros e introspectivos.  Para a realização dele, a diva se inspirou em artistas que sabiam experimentar com diferentes texturas da música eletrônica – Björk, por exemplo –e criou um dos melhores discos de sua carreira.  Contrariando sua obra, seu objetivo em seu sétimo álbum não era revolucionar a cultura em geral, mas mudar o seu eu interior. No final da década, ela tinha encontrado um novo propósito e ficou disposta a divulgar sua nova perspectiva de vida para seus ouvintes.

Os anos 2000

Logo no primeiro ano da década, Madonna já apresentou uma nova persona, agora ela era uma cowgirl. No clipe de “Don’t Tell Me” ela se apresentou de camisa xadrez, calça jeans, chapéu de cowboy e botas de couro mostrando seu novo guarda-roupa. Ao contrário do que sua nova versão vestia, o disco “Music” (2000) não é country, mas bem disco, com músicas como “Music” e “Runaway Lover” que são voltadas para as pistas de dança. Na época, a cantora tinha acabado de se casar com o diretor Guy Ritchie, que dirigiu o clipe de “What It Feels Like for a Girl”. Não conseguindo fugir de polêmicas, o vídeo foi proibido de ser exibido na MTV e no VH1 por estimular atos de vandalismo.

Outro ponto contraditório desse lançamento é o cover “American Pie” de Don McLean, considerada uma das grandes canções dos Estados Unidos. Em sua versão, ela não cantou todos os versos da versão original – até pelo motivo dela durar mais de oito minutos – e faz umas brincadeiras em torno do sentido de patriotismo no clipe, o que irritou alguns americanos. Contudo, o compositor da música elogiou a nova versão e disse que era “um presente de uma deusa”.

Depois de dois discos amenos, a artista decidiu voltar a chocar o público. Inspirada no cenário político estadunidense pós eleição de Bush e do 11 de setembro, Madonna lançou “American Life”, um dos seus trabalhos com opiniões mais divididas. Tocando em assuntos como moralidade e ética, o álbum foi visto por muitos como antinacionalista. Por exemplo, no clipe da faixa-título, a guerra é retratada como entretenimento. Já em “Die Another Day”, o vídeo apresentou Madonna como uma prisioneira em uma câmera de tortura.

“American Life” foi uma era da artista bem questionada pelos seus fãs, mas teve um momento emblemático para a cultura pop: a apresentação no VMA de 2003. No palco, Britney Spears e Christina Aguilera reinterpretam “Like a Virgin” e Madonna apresenta uma nova versão de “Hollywood “ com Missy Elliott. Foi nessa apresentação que a rainha do pop beijou a dupla de novas divas do pop, para a surpresa dos espectadores.

Após o fracasso comercial de seu disco anterior, Madonna precisou se reinventar –sim, mais uma vez. Em uma decisão muito ousada, ela olhou para o passado da música e decidiu torna-lo o seu presente. Assim, inspirado na música eletrônica dos anos 1980, nasceu “Confessions on a Dance Floor” (2005). Nesse ponto de sua trajetória, a cantora já se superou inúmeras vezes, mas é muito curioso pensarmos em uma mulher que conseguiu dar a volta por cima e colocar seu nome no topo em seu décimo álbum de estúdio. As doze faixas se complementam em um longo e vibrante DJ set que representando a grande epopeia do pop que Madonna criou. Músicas como “Hung Up”, “Sorry” e “Jump” a fizeram ser relevante para um novo público, mesmo após trinta anos de seu primeiro lançamento.

Além disso, a “Confessions Tour” lucrou mais de 195 milhões de dólares e obviamente também rendeu algumas polêmicas. Na hora de cantar “Live to Tell”, ela aparecia crucificada e usando uma coroa de espinhos, o que não foi bem visto em alguns países por onde a tour passou. A Igreja Ortodoxa Russa pediu o boicote de seu primeiro show em Moscou, alegando que ela fazia o uso indevido de símbolos religiosos. Na Holanda, um padre ameaçou bombardear o show. O Papa Bento XVI sugeriu que ela fosse excomungada pela ação e a máfia italiana também ameaçou sequestrar a família dela caso os shows continuassem. Porém, nada a impediu de seguir realizando os espetáculos.

Para tentar superar o Confessions, Madonna decidiu parar de olhar para o passado e procurar o que havia de melhor no presente. Assim, juntou Pharrell Williams, Timbaland e até Kanye West para o “Hard Candy” (2008). Infelizmente, o resultado acabou genérico e superficial. Entretanto, foi um sucesso de vendas impulsionado pelo hit “4 Minutes” em que o vocal é compartilhado com Justin Timberlake. Chegando nos anos 2010, a artista ainda se mostrou destinada a mudar seu estilo para a busca do sucesso. Contudo, ao contrário de seus outros trabalhos, suas tentativas de reinvenção passaram a não serem tão bem recebidas pelos seus fãs.

Os anos 2010

É impressionante admirar uma artista que superou décadas de polêmicas continuar dando a volta por cima, vendendo milhões de CDs e lotando todos os estádios ao redor do mundo. No entanto, mesmo com sua vasta discografia, “MDNA” (2012), “Rebel Heart” (2015) e “Madame X” (2019) são trabalhos inconsistentes que não cativaram seus fãs de longa data e também não a fizeram conquistar novos públicos.

“MDNA” é um bom disco no geral, apresentando uma Madonna bem despreocupada e que só pensava em curtir a vida. Faixas como “Give Me All Your Lovin’” e “Girl Gone Wild” são bem descontraídas e fáceis de cantar, mas o disco de dezesseis faixas possui muitas músicas medianas e fracas. Já “Rebel Heart” é uma tentativa de mostrar uma vulnerabilidade da artista, como se ela reconhecesse os erros dos seus álbuns anteriores. Mesmo assim, é um disco totalmente comercial, com pouquíssimos momentos inspirados da artista.

O “Madame X” dividiu o público, com muitos achando um trabalho confuso enquanto outros viram como uma verdadeira obra-prima. Chega a ser engraçado pensar que o responsável pela renovada de ares da cantora foi o futebol, pois Madonna decidiu se mudar para Portugal, onde seu terceiro filho poderia treinar o esporte. Por dentro da cultura portuguesa, ela explorou os novos estilos que conheceu no país, cantou em português em algumas músicas e percebeu que já estava na hora de ser coadjuvante de seu próprio trabalho ao chamar novas vozes da música para feats.

Agora, em 2020, Madonna chegou aos 62 anos mostrando que dominar o mundo foi fácil, mas que para muda-lo ela precisou superar diversos obstáculos e se colocar na linha de frente de inúmeras batalhas. A música pop como conhecemos hoje se deve muito a sua discografia, ajudando na formação de diversos novos nomes da indústria. Se aventurar na discografia de Madonna é conhecer cada trajeto que o pop percorreu nas últimas quatro décadas. Uma mulher que não teve medo de ousar e dar espaço para inúmeras causas sempre será a Rainha do Pop, título incontestável mesmo com os altos e baixos de sua carreira.

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